segunda-feira, 17 de dezembro de 2012


Capítulo 7 – Para explicar melhor o capítulo 6

“A dúvida é o principio da sabedoria”. Aristóteles
                                                                                              

Certa feita, o doutor Sigmund Freud acabava uma de suas palestras quando uma senhora aproximou-se dele e perguntou qual seria a melhor maneira de educar seu filho. Freud disse-lhe para educar a criança de qualquer jeito, pois iria inevitavelmente errar.

Faço aqui um relato que surpreendeu pesquisadores americanos que estudaram a influência do comportamento dos pais nas escolhas dos filhos. Nessa pesquisa foram entrevistados dois irmãos gêmeos que, aos 25 anos tinham seguido caminhos muito diferentes. Um deles estava fazendo pós-graduação em Harvard, era um cientista.O outro aguardava a execução no corredor da morte, era um homicida.

Quando perguntados sobre os motivos de estarem onde estavam, ambos deram, curiosamente, a mesma resposta: “Sendo filho de um pai alcoólatra e usuário de drogas que espancava a esposa e os filhos constantemente, não havia outro caminho a seguir a não ser esse”.

Seria estupidez acreditar que para  se conseguir um doutor de Harvard os pais deveriam usar drogas e espancar a esposa e os filhos. Mas seria ingenuidade acreditar que só filhos espancados pelos pais são levados para o crime.

 Escrevi isso porque talvez tenha ficado ao atento leitor uma sensação de desconforto quanto ao que se leu no capítulo anterior. Seu bom senso o faria pensar que o autor desse texto defende a aceitação e a prática  de maus-tratos. Vamos corrigir isso imediatamente e esclarecer que:

• Os métodos que são eficientes na educação de uma criança não serão necessariamente bem sucedidos na educação de outra criança. Cada pessoa responde de forma diferente aos estímulos ou às repreensões recebidas;

• Numa mesma família, há filhos que se orientam facilmente pelo diálogo, outros podem necessitar de um discurso mais austero, outros podem perceber onde erraram somente quando deixados a sós, consigo mesmos, naqueles 15 minutos de reflexão forçada no silêncio do quarto. E finalmente há aqueles que a orelha não ajuda que se ouça e compreenda uma mensagem. Para esses,talvez, um puxãozinho nessa orelha possa lembrar  que ela existe.

• Não conheço ninguém que goste, aceite ou compreenda um constrangimento, pois essa é uma experiência extremamente desagradável;

• O vexame só tem algum efeito positivo se faz a pessoa ver a si mesma na sua pior forma, para que ela queira buscar a sua melhor versão;

• Nada de bom advém de uma intenção maligna. Se os pais acreditavam que a humilhação colocaria seus filhos no caminho do bem e da verdade, isso vinha de um zelo só decorrente do amor, por mais severo que parecesse;

• Ninguém pode educar a partir  da violência, agressões gratuitas, injustas e desmedidas devem ser banidas de uma sociedade civilizada. Minha mãe dizia que suas palmadas no traseiro nos empurravam para a frente e seus puxões de orelha nos levavam para o alto. Bela justificativa.

• Na maioria das vezes, e infelizmente, nossos políticos não servem de referência moral, pois já perderam a sensibilidade necessária para envergonhar-se. Os poucos que lá estão, preservados, devem ter vergonha, sim, de serem honestos, como diria nosso Rui Barbosa.

• Transformar um vexame em um aprendizado não é fácil, nem rápido, muito menos indolor. É preciso praticar a humildade com paciência e amor próprio. Ser humilde não significa ser inferior, mas ter consciência plena e tranquila de seus limites e de suas incertezas.

• Vivemos tempos em que se idolatra a beleza e o poder, em que a vaidade cega as pessoas e as afasta da consciência crítica. É urgente resgatarmos a famosa “vergonha na cara”, que formou gerações de pessoas responsáveis e que demonstravam respeito aos seus pares. Hoje a vida parece significar muito pouco, especialmente a do outro.

Enfim, não precisamos ter vergonha de ter vergonha, pois ter vergonha significa que temos a capacidade de buscar referências, perceber como e por que erramos e, principalmente, a vergonha nos motiva a rever posicionamentos.

            A atriz Cássia Kiss, que há alguns anos, depois de assumir publicamente que quando jovem realizou um aborto ilegalmente, aderiu às campanhas de orientação para a preservação da vida e para o aleitamento materno, inclusive amamentando seu filho em uma bela e rica demonstração de reelaboração de  atitudes.

            Como pais e educadores, viveremos sempre o dilema de educar. Sempre acharemos que fomos duros demais ou complacentes demais com aqueles sob nossa responsabilidade. Há muita diferença entre ser bom e ser justo. A justiça não supõe bondade, supõe equilíbrio.

            Quantos desequilibrados andam por aí, causando dor e sofrimento a si e aos outros – são depredações de patrimônio, espancamentos de mendigos, atropelamentos, roubos, assassinatos, agressões nascidas de preconceitos, abusos e crimes contra a própria família – não poderiam ter sido melhor orientados quanto aos danos que seus comportamentos iriam trazer a eles e aos outros no futuro.

A criança mal intencionada e de instintos destrutivos, protegida por uma lei que proíbe que ela leve umas boas e educativas palmadas, se tudo correr mal,será um bem sucedido agressor de seus próprios pais, de seus filhos e de quantos mais estiverem em seu caminho.

Um comentário:

  1. Mané amei o livro !!! sinto tanto a sua falta e das nossas conversas bjs no coraçao

    ResponderExcluir