quarta-feira, 9 de janeiro de 2013


Esta é a última publicação. Aproveito as férias para concluir esta tarefa. Boa leitura.

Capítulo 10 – Amigos
“A verdadeira amizade é aquela que nos permite falar, ao amigo, de todos os seus defeitos e de todas as nossas qualidades”.       Millôr Fernandes                                                                           

Os amigos merecem um capítulo só para eles. Inclusive em nossas vidas.
É muito difícil definir a importância de um amigo; muitos já tentaram, páginas e mais páginas foram impressas nos mostrando o quanto é importante termos o amigo especial, de todas as horas, para todas as horas.
Normalmente não temos problemas para conseguir amigos, os problemas começam quando convivemos com eles. As amizades à distância tendem a durar mais e a se abalar menos. É no corpo a corpo da convivência que as coisas tendem a se complicar; à medida que as exigências aumentam, a paciência e a boa vontade diminuem.
Esse capítulo não era para os amigos? Sim, todos eles, especialmente aqueles que magoam e são magoados, os que perdem e os que fazem perder, pois isso, afinal não tira deles a qualidade de amigos.
Dias melhores supõem também encarar o fato de que as coisas nem sempre andam ou terminam bem nas relações que mais prezamos.
Quando alguém nos diz que está prestes a se divorciar, deveríamos nos entristecer, pois duas pessoas que se casaram, começaram como amigos, que ficaram tão especiais que decidiram dividir tudo. Descobrir que não são mais os mesmos deve ser uma das suas maiores frustrações, até porque os dois não se desgostam na mesma proporção, sempre sobra um pouco mais de dor para um deles quando tudo acaba.
Por que as amizades chegam ao fim? Por que, quase de repente, desconfiamos que a pessoa deixou de ocupar aquele lugar especial nas nossas mentes e corações?
Lá vamos nós de novo dizer que quando algo falha, ou acaba, ou não funciona mais como gostaríamos, isso não é totalmente ruim, que não há nada que nos obrigue a continuar com o processo, até porque nada é tão ruim que não possa ficar pior.
Entre não gostar mais, não  respeitar mais, não  suportar mais e ofender e agredir, há uma vasta série de limites ou estágios  a serem percorridos. É preferível que se perceba, o quanto antes, que o rumo das coisas pode não ser o melhor, mas infelizmente pode ser o pior.
Vamos por partes. As pessoas começam a se desgostar por razões quase que óbvias. Recorro a Guimarães Rosa para lembrar ao meu leitor um fato bastante verdadeiro para todos: “O senhor… mire, veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam, verdade maior. É o que a vida me ensinou”. (Grande Sertão: Veredas)
As pessoas mudam. Desde que nascem,  a pele e os olhos – ou o olhar -  e os cabelos. Nós mesmos não nos reconheceríamos se, através de uma viagem no tempo, pudéssemos nos reencontrar quando mais jovens.  Veja como Cecília Meireles explica as mudanças que sofremos no belo poema Mulher ao Espelho:
Mulher ao Espelho

Hoje, que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.

Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz,
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.

Que mal fez, essa cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se é tudo tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?

Por fora, serei como queira
a moda, que vai me matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.

Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.

Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

 É por isso que as pessoas acabam por se desinteressar ou desgostar daqueles para quem juraram, em algum momento, fidelidade e consideração por toda a vida. A maior parte das mudanças nem sempre são intencionais, positivas ou compreensíveis. Há momentos que percebemos com tristeza a mudança em nós e naqueles que amamos.
O fato de as pessoas mudarem com tanta intensidade surpreende  e  assusta. Ainda mais quem convive com elas durante todo o processo de mudança. As mães, por exemplo, demoram muito para compreender e aceitar que aqueles que tanto dependeram dela, de repente julguem-se aptos a viverem sozinhos e enfrentar seus desafios sem a cobertura protetora da mãe.
Quantos filhos recorrem às mães para decidir coisas insignificantes,  o que muito as alegra, pois isso prova que não deixaram de ser úteis. Uma pesquisa recente associou o aparecimento do câncer de mama ao período posterior à saída dos filhos de casa. Nas implicações psicológicas profundas, a  relação é inegável, não há mais necessidade de nutrir, portanto pode perecer. 
Muitos pais sentem-se deprimidos quando seus filhos tornam-se aptos a viverem por si. Ninguém se prepara para deixar de ser importante na vida de ninguém, especialmente quando temos prazer em estar a serviço desse alguém.
Quando as mudanças se dão com os amigos, elas decorrem principalmente da idade, do universo social e até da formação intelectual da pessoa. Um velho colega de infância apareceu-me certa vez, na casa de meus pais, depois de mais de quinze anos que não nos víamos. Ele se tornara andarilho. Sujo, alcoolizado e com lágrimas nos olhos ele me confidenciou que usava drogas desde os doze anos e que, com a morte da mãe, viu desaparecer qualquer chance de uma  tentativa de recuperação. Toninho era o seu nome. Incrivelmente eu vi diante de mim o Toninho da minha infância, do futebol na rua, das tardes em que soltávamos pipas, arrasado e sem perspectivas. Só consegui prometer-lhe que em caso de fome poderia procurar por minha família.
Perdi mais dois amigos que muito considerava. Um deles morreu três meses após o nascimento de seu primeiro filho, num acidente. Foi um velório dos mais difíceis, ele tinha 23 anos, só um ano a mais que eu.
O outro amigo eu perdi, imagino, para a ambição. Ele foi bem sucedido e aos poucos foi trocando os velhos amigos da infância pobre por novos amigos, mais ricos e influentes.
Caro leitor, você também deve ter perdido amigos, ou vai perdê-los. Não existe nada que justifique nossa surpresa quando somos traídos ou abandonados. Isso é um fato tão certo, que o próprio Cristo o vivenciou, traído por Judas e negado por Pedro.
Imaginemos por um momento que alguém, em quem confiamos muito, diga que não nos conhece para poupar-se de um constrangimento. Imagine agora o quanto Cristo sentiu esse fato, principalmente por saber antecipadamente que ele se daria.
Os amigos que ficam são aqueles que suportam bem nossas mudanças e cujas mudanças suportamos bem. A nostalgia dos velhos tempos exige uma boa dose de compreensão.
O que mais impressiona é pensarmos que os amigos que nos  deixam  podem contribuir muito  para nosso crescimento, fazem-nos exercitar a paciência e o autocontrole, a humildade, a tolerância e até mesmo a piedade.
Sofremos muitas vezes porque não conseguimos compreender que a distância que nos separa dos amigos é talvez menor que aquela que nos separa de nós mesmos. O amigo mais caro que perdemos é justamente aquele do espelho, nós mesmos,  quem nós deixamos de ser para nos tornar quem somos. Oswaldo Montenegro nos faz um alerta sereno e triste - talvez menos triste que sereno – sobre as mudanças em sua canção A Lista. Observe:

Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais...
Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você desistiu de sonhar!
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar...
(...)
Quantos amigos você jogou fora?
Quantos mistérios que você sondava
Quantos você conseguiu entender?
(...)
Quantas mentiras você condenava?
Quantas você teve que cometer?
Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você?
(...)
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você?

Conheço gente que se envergonha da alegria que tinha e das bobagens que falava. Conheço gente que ostenta hoje uma expressão que nem sonhava ter quando bebia cerveja barata e dividia a conta com mais dois amigos. Conheço gente que insiste em acreditar que ter mais dinheiro pode fazer sua vida ter mais qualidade. Conheço gente triste cuja maior realização é parecer feliz.
De algum modo, ter pensado nisso e considerado a naturalidade com que isso se dá, ajudou muito a respeitar todas as pessoas por princípio.
Acredito que o leitor também conheça gente assim. Talvez agora esteja pensando naquelas companhias agradáveis que se vão rolando pelo tempo do esquecimento.
Precisamos aprender que somos atraídos por ideias e atitudes, talvez até mais que  por pessoas. Gente que admiramos em uma época podem ter se revelado tão distante do que eram que deixaram de importar ou de valer a pena.
Dias melhores vão ser aqueles em que não teremos a pretensão de sermos perfeitos ou de esperar que as pessoas sejam perfeitas. Cuidemos bem das amizades que sobreviverem às inevitáveis mudanças e já teremos feito muito em favor de uma vida mais plena e mais verdadeira.  
O bom jardineiro não é aquele que lamenta as sementes que não germinaram, mas aquele que se alegra com o colorido das flores que conseguiu cultivar. 

Epílogo – Vá cuidar da sua vida

Egoísmo não é viver à nossa maneira, mas desejar que os outros vivam como nós queremos”. Oscar Wilde
                                                                                                                          
Quando pensada fora de um contexto, essa expressão é mais facilmente associada a uma mensagem negativa. Imaginamos ouvi-la de alguém que recebeu um conselho e não o aceitou.
Pensando melhor nos componentes dessa mensagem talvez se consiga tirar algo de proveitoso dela. Primeiro a palavra “Vá” refere-se ao imperativo do pronome você. Isso mesmo , Vá você. O termo “cuidar” não tem nada de negativo, muito diferente disso. Cuidar é o mesmo que zelar, proteger, ocupar-se de, manter a integridade de ou simplesmente prestar mais atenção. “sua vida” quer dizer que ela não pertence a mais ninguém a não ser você, daí a importância desse elemento.
Então, apesar da clara intenção do “me deixa em paz”, temos a seguinte mensagem revista como: Você deveria ocupar-se mais das questões que envolvem sua vida, porque se dedicar à vida de outras pessoas, definitivamente não resolverá seus problemas, nem os dela.
Apesar da grosseria com que sempre é dita a frase “Vá cuidar de sua vida”, ela esconde um conceito de grande importância, se for percebido e colocado em prática.
Certa vez, enquanto molhava meu jardim, um vizinho bem intencionado parou e me chamou a atenção para alguns pontos de ferrugem em meu portão. Alertou-me para o prejuízo que eu teria caso a ferrugem se estendesse muito e finalmente recomendou-me que fizesse uma nova pintura.
O portão da casa desse vizinho não havia sido sequer pintado e apresentava muito mais problemas com ferrugem que o meu, mas ele achou conveniente ocupar-se do meu problema. Certamente não havia maldade nas suas observações, mas ele perdeu a oportunidade de pensar e resolver seu problema para pensar o problema de outra pessoa.
Quantas vezes passamos por isso, dos dois lados da situação? Sempre que estamos passando por um problema, qualquer que seja sua natureza, há alguém com uma pronta solução que, aliás, não serviu para resolver os problemas que a própria pessoa tem.
Exatamente como um médico pneumologista que alertou meu pai para os perigos do tabagismo enquanto fumava tranquilamente seu cigarro numa época que se levava tão pouco a sério essa questão que médicos fumavam dentro de seus consultórios, enquanto davam conselhos tão “valiosos” como esse.
Meu pai nunca deixou de fumar, não quis, pois não tinha motivos para fazê-lo, já que seu médico fumava e não via problema nisso.
Um bom exemplo pode ser mais útil que muitas palavras insensatas.
 Os chineses são famosos, especialmente os sábios, por darem respostas que não respondem o que se pergunta. Um desses sábios, quando perguntado sobre como resolver um determinado problema, respondeu que se um problema tem solução, então há solução, mas se não tem solução, então não há solução.
A aparente singeleza da resposta engana aos menos cuidadosos, pois temos toda a lógica exigível de uma resposta. Se o problema tem solução, então deve-se procurar resolvê-lo da melhor forma possível, pois uma solução existe. Se não há resposta, não convém perder nosso tempo com isso, é inútil procurar algo que não existe.
A questão maior é como sabermos se existe uma solução para um determinado problema. Como podemos ter certeza de que os nossos esforços nos levarão ao que pretendemos.
A vida nos oferece exemplos diários para todas as situações. Todos os dias encontramos pessoas que têm um determinado desafio a ser superado, muitas o fazem e muitas outras não. Vale a pena nos atermos às pessoas que superam seus desafios, e especialmente observar as estratégias adotadas.
Um fabricante de creme dental pediu sugestões para aumentar as vendas de seu produto e a sugestão que foi aprovada era incrivelmente simples, aumentar o diâmetro da abertura da embalagem, de modo que sairia mais creme dental a cada vez que o tubo fosse pressionado. Funcionou.
Então, por que uma pessoa prefere resolver problemas alheios ao invés de seus próprios?
Não é muito fácil olharmos para nossa própria vida por uma razão bem simples: se percebermos nosso problema como algo que pode ser resolvido, seremos obrigados a tomar uma decisão e uma atitude, que sejam eficientes para a solução desse problema.
O que nos impede não é exatamente o problema, nem mesmo a solução que ele exige. Nem sempre estamos dispostos aos sacrifícios necessários para que a questão seja solucionada. Em termos simples, queremos uma omelete, temos os ovos, mas precisamos quebrá-los. Eis a questão.
O amor
Em questões afetivas, muitas vezes a dificuldade não está no que  outro faz, mas no que ele é. Se fosse uma atitude o motivo do descontentamento, isso poderia ser negociado, mas um modo de ser, uma personalidade, não se muda tão facilmente. Geralmente, quando ocorre um rompimento amoroso consensual, as duas partes acabam percebendo que demoraram muito para tomar a decisão.
A dificuldade de se  optar pelo sim -  sim, essa relação é compensadora -  ou pelo não -  não, não vale o esforço em vista da compensação -  está ligada essencialmente ao preço que se paga por uma decisão como essa.
Aceitar a relação com todos os seus limites implica viver com a frustração que isso vai impor. Por outro lado, abandonar o projeto afetivo parece apontar para uma incapacidade de gerenciamento das próprias emoções. Muitas vezes, a opção de insistir na relação pode sugerir que se quer apenas o conforto, que uma mudança iria abalar. Há sempre o medo de que o que está por vir pode ser mais doloroso que aquilo que se tem.
Virar a mesa e apostar no desconhecido, numa nova rota, vai exigir uma habilidade que pouco praticamos: encarar problemas como se fossem desafios que, vencidos, nos mostrariam que somos capazes.
Caso contrário, o desafio perdido deveria exigir nova mudança de estratégia. Precisaríamos perder o medo de ter medo de ter medo de ter medo de ter medo. Só com muita dedicação e paciência isso é possível.

O trabalho
Poucas vezes temos escolha em termos do que fazemos. Vários fatores determinam nossos caminhos profissionais. A família ( vovô e papai são advogados, então... ), a condição social ( só posso pagar um curso de administração), a condição intelectual (só posso entrar num curso com até 5 candidatos por vaga) ou ainda a condição  de apatia (pode ser qualquer um, não ligo a mínima).
Geralmente acreditamos que nosso emprego é parte integrante fundamental de nossa existência, tanto que muitas pessoas perdem sua vida familiar, afetiva e até social para a manutenção de seu emprego. No fim restará o discurso frustrado de quem vive dizendo: “se eu tivesse a sua idade...”.
Convêm lembrar que uma escolha determina que muitas outras opções sejam deixadas de lado. Escolher uma profissão frequentemente implica em deixar de lado muitas outras formas de realização profissional em termos de salário e satisfação.
Numa sociedade em que um atleta ganha muito mais que um médico, um juiz ou um professor, é comum sermos tentados a buscar mais um salário que um emprego. Essa é uma armadilha dissimulada. Muitos jovens de periferia acabam trocando o esforço imenso de frequentar a escola pela possibilidade tênue de serem escolhidos nas famosas peneiras dos clubes de futebol.
A equação não é fácil. Temos contas a pagar, temos compromissos e temos também uma satisfação pessoal a garantir. Tudo somado, parece difícil chegar ao que se pretende.
O que aprendi em quase vinte anos como professor é que devemos preservar nossa integridade
•Física: precisamos estabelecer limites físicos para o trabalho (há professores que lecionam até 60 horas/aula por semana, funcionários que trabalham até 14 horas por dia,há quem passe as madrugadas e fins de semana produzindo relatórios)
•Intelectual: não se pode trabalhar escondendo sua concepção real das coisas em função do grupo (um conhecido contou-me certa vez que era cobrado em sua empresa por que tinha um carro velho e não se importava com carros novos. A maioria dos seus colegas, não entendia que ele simplesmente não via sentido em se manter esse status de funcionário bem sucedido )
•Moral: Não se deve aceitar que seus valores mais autênticos sejam massacrados pela necessidade de manter seu emprego. Certamente há mais maneiras de se trabalhar de acordo com seus princípios. (há muitos trabalhadores que sofrem de forma silenciosa pelo que são obrigados a fazer,  por exemplo estar a serviço de um banco que explora de forma abusiva e desleal seus clientes, isso sem falar nos funcionários ligados ao poder público, subordinados a chefes corruptos)
•Humana: não se deveria permitir que os superiores humilhassem seus subordinados. A autoridade nunca poderia ser trocada pelo autoritarismo (hoje há até mesmo um termo que designa esses abusos: assédio moral, um crime passível de punição, incluindo indenização)

A religião
Muita gente ainda confunde com Religião e Igreja. Convém lembrar que fé é um sentimento íntimo, autêntico, que cada pessoa carrega dentro de si acerca da aceitação de Deus e da compreensão em seus propósitos e sua ação no mundo natural.
Religião é o caminho pelo qual se escolhe chegar a Deus, de acordo com as preferências pessoais e adequação ao programa estabelecido, por exemplo, no Judaísmo é proibido o consumo de carne de porco, no Islamismo não se pode consumir bebidas alcoólicas. Atualmente são seis religiões reconhecidas mundialmente: Cristianismo, Islamismo, Budismo, Hinduísmo, Judaísmo e Candomblé.
A Igreja é o veículo que se escolhe para percorrer o caminho. Geralmente as pessoas escolhem a igreja que mais atende às expectativas que têm em relação aos seus conceitos de Deus e de Religião.
Vale lembrar que aproximadamente 2% da população mundial se declara ateu, ou seja, não concebem a existência de um Deus e muitos não concebem sequer a existência do mundo espiritual.
Cada uma dessas religiões se distingue em aspectos fundamentais da compreensão do mundo espiritual. O Cristianismo fundamenta-se na ressurreição, enquanto o Budismo entende que há a reencarnação. Há no mercado inúmeros livros que aprofundam e esclarecem as diferenças entre as religiões e desmistificam boa parte dos preconceitos que envolvem essa questão.
É comum a pessoa questionada sobre a sua religião declarar-se católica, evangélica, Testemunha de Jeová ou mesmo espírita. Todas essas denominações são caminhos diferentes dentro do Cristianismo. Todos professam na verdade uma mesma religião sob diferentes bandeiras.
Em minha experiência com pessoas aprendi que é muito delicado julgar ou estabelecer valores acerca das escolhas dos caminhos para se chegar a Deus. Para se ter uma ideia, há um princípio que existe em todas as seis religiões, conhecida como a Regra de Ouro: “Trate os outros do modo como você  gostaria de ser tratado"
Desde a Antiguidade a Regra de Ouro tem sido uma ótima referência moral e certamente garantiria uma existência pacífica. Apesar disso vemos católicos e protestantes se enfrentarem na Irlanda, muçulmanos e judeus se enfrentando no Oriente Médio. Em nome de Deus se cometem as maiores atrocidades contra pessoas cujo único crime foi ter escolhido um modo diferente de chegar a Deus.
Se nossa escolha religiosa nos torna intolerantes, se nos faz sentir superiores a qualquer outra pessoa então há algo de errado com essa opção. Deus é uma referência de bondade, de amor, de justiça e de misericórdia. Nós não somos Deus. E na nossa frágil condição somos afetados pela vaidade, pela ganância, pela angústia existencial e por sentimentos que inventamos ao longo de nossa experiência humana.
Há um registro de mais de 20.000 seitas e igrejas espalhadas pelo mundo todo, todas derivadas das seis religiões principais. As extremas diferenças de leitura dos textos sagrados vão desde o absurdo da condenação imposta aos homossexuais - ser enterrado vivo – em alguns países islâmicos até a recentíssima Metropolitan Church, uma igreja cristã nos EUA, que é dirigida e destinada a todas as categorias sexuais diferentes da heterossexualidade: homossexuais, bissexuais, transexuais, travestis, prostitutas, drag-queens e  qualquer outra opção sexual rejeitada por igrejas tradicionais.
Precisamos considerar que Deus é bom, tão bom que faz as coisas acontecerem ao seu tempo e a seu modo. Para ilustrar nossa incapacidade de compreender os projetos de Deus, vale recordar uma história que aconteceu nos anos 90, em São Paulo.
Havia alguns anos que um estudioso americano sugerira um programa que colocasse frente a frente vítimas e agressores depois de passado algum tempo do ocorrido. Esse projeto foi um fracasso, mas como sempre, foi trazido ao Brasil e posto em prática em algumas cidades.
Um dos casos apresentou um desfecho muito diferente do esperado. Enquanto se esperava que as vítimas pudessem no máximo perdoar o agressor, um homem paraplégico, de aproximadamente 35 anos procurou o programa para agradecer ao homem que fez com que ele dependesse de uma cadeira de rodas para o resto de seus dias. Estranho, não?
Esse homem foi, até os 20 anos, um bandido conhecido da polícia por assaltos, tráfico, homicídios e outros crimes mais. Durante um assalto ele foi alvejado por um policial – esse único tiro o deixou paraplégico – e assim que saiu do hospital viu seu mundo de acabar. Seus dias de criminoso chegaram ao fim.
Sem outra opção, apegou-se à fé, decidiu voltar a estudar e, depois de 10 anos, concluiu o curso de direito, de modo que a sociedade, por meios tortuosos, trocou um bandido por um homem de bem. Daí o motivo desse homem desejar agradecer ao policial por ter-lhe tirado o direto de andar. Foi uma tragédia pessoal que o fez encontrar, em si, algo que valia a pena.
Não acredito que Deus tenha levado esse homem ao crime e depois o tenha feito sofrer o que sofreu apenas para divertir-se. Deus deu a ele o livre arbítrio para escolher. Penso que Deus apenas permitiu uma troca de roteiro, para que esse homem pudesse ter contato com outra versão dele mesmo. 

Eu
Ninguém, estando insatisfeito consigo mesmo, poderá oferecer alegria ou bem-estar àqueles com quem convive. É fundamental preservar nossa condição de pessoa satisfeita com o que é, com o que faz e  com o conjunto de tudo que a cerca: família, trabalho, amigos,  oportunidades e possibilidades de sonhar. Mais que sonhar, sonhar sonhos que sejam concebidos como possíveis de se realizar.
Dias melhores só serão vividos quando estivermos dispostos a contribuir para isso, quando entendermos que nossa Cida e nossa felicidade não podem ser entregues nas mãos de outras pessoas, que não podem e nem devem ser responsáveis por nós, pois têm que cuidar de suas próprias vidas.
Precisamos assumir que nossa felicidade depende essencialmente de nós. Nossa família e nosso ambiente de trabalho  serão o reflexo do que intimamente desejamos ser.
Quando permitimos que alguém estrague nosso dia parte da culpa é dela, parte da culpa é nossa. Quando retribuímos uma cara feia ou uma atitude de desrespeito, estamos permitindo que o outro determine como devemos nos comportar.
Infelizmente, aprendemos a “dar o troco” e acabamos nos prendendo de vez àqueles de quem deveríamos manter distância segura. Perdoar alguém é uma excelente maneira de nos livrarmos do mal que essa pessoa nos causou. Por outro lado, quando alimentamos sentimentos de rancor, ódio ou vingança, estamos perpetuando a presença do mal em nossas vidas.
Livra-se desses sentimentos não é fácil, nem rápido. É fundamental praticar o perdão.  Aliás, muita gente acredita que o perdão é uma atitude  emocional. Não é. Perdoar exige uma séria decisão racional de não permitir que esses ressentimentos ocupem sua mente. É preciso dedicar-se pacienciosamente a excluir ideias negativas acerca das coisas e das pessoas.
O filósofo Sócrates disse uma vez que preferia ser vítima de uma injustiça a cometer uma injustiça contra alguém, pois ser injustiçado não diminui nosso real valor, mas cometer uma injustiça, sim.
Precisamos acreditar de fato que ser triste ou sofredor pode atrair a atenção e o cuidado daqueles que nos cercam, mas não nos melhoram em nada, não se deve pretender ser aquele que não conseguiu por meios próprios vencer seus desafios, e que por isso conta com a piedade alheia.
Nossos modelos precisam ser revistos, a voz do povo não é a voz de Deus, a maioria das pessoas vivem sem refletir sobre sua existência. “Todo mundo” não serve de parâmetro nem de modelo para nossos objetivos. Foi a voz de um povo que libertou Barrabás e condenou ao suplício e à morte Aquele que só falou de amor, que só buscou a paz, que só incentivou a justiça, que só ensinou o perdão.
Essas páginas foram pensadas por muitos anos. Mesmo assim parece que sempre fica faltando alguma coisa. Há tanto a dizer e tão poucas palavras capazes de o fazer.
Não gostaria que o leitor imaginasse que desejo ensiná-lo a viver. Seria pretensioso e ingênuo pensar que isso é possível. Só escrevi o que pensei que poderia ajudá-lo  a encontrar, em si mesmo, as respostas que muitas vezes procuramos por toda parte, sem encontrar.
Não há uma verdade, pelo menos não uma verdade que se aplique a todos. Cada um deve garimpar em seu íntimo as trilhas necessárias para se chegar aos seus reais objetivos. Penso que todo mundo quer  algo muito parecido: ser feliz. Viver melhor, mais intensamente, andar mais leve e respirar um sentimento de paz.
Muitos gênios já deram grandes contribuições para se viver em plenitude. Obras como O Pequeno Príncipe, Fernão Capelo Gaivota e O Menino do Dedo Verde, compositores como Beethoven, Mozart e Vivaldi, escultores como Michelângelo e Rodin, pensadores como Sócrates e Sêneca, artistas como Chaplin e escritores como Shakespeare, Fernando Pessoa e Pablo Neruda podem nos apresentar modos muito particulares de se observar a vida e os homens, compreender e avaliar essa nossa temerosa existência. Vale a pena conhecê-los.
Mas, acima de tudo, vale a pena conhecer a si mesmo.